Mercado financeiro teme impacto de declarações de Lula sobre guerra entre Israel e Irã

Para banqueiros, qualquer sinal de apoio ao Irã pode gerar retaliações econômicas e agravar a crise interna no Brasil
A escalada do conflito entre Israel e Irã, com a entrada direta dos Estados Unidos, acendeu um alerta no mercado financeiro brasileiro, que agora vê com preocupação as possíveis manifestações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o tema. Para lideranças do setor, qualquer comentário do chefe do Executivo que seja interpretado como alinhamento ao Irã pode custar caro ao Brasil, já pressionado por inflação persistente, alta de juros e instabilidade no câmbio.
O recado de agentes financeiros da Faria Lima, coração do mercado em São Paulo, é claro: silêncio. “É só o Lula ficar quieto e não defender o Irã”, disse, em condição de anonimato, um banqueiro ouvido pela reportagem. Outro executivo de uma gestora de ativos foi direto: “Ficar calado, pois já temos problemas demais”.
Gafes no G7 acendem sinal de alerta
As preocupações aumentaram após os episódios protagonizados por Lula durante a cúpula do G7, realizada na semana passada. O presidente foi repreendido por lideranças internacionais por interromper discussões e falar de forma inoportuna. Em uma das sessões, Lula chegou a reclamar da ausência de som ao microfone no momento em que outro chefe de Estado discursava, o que foi considerado deselegante.
Embora as gafes não tenham causado maiores rupturas diplomáticas, elas reforçaram, entre investidores e diplomatas, a avaliação de que o Brasil precisa agir com extrema cautela em um cenário de tensão global ampliada. Com o envolvimento direto dos EUA nos ataques a instalações nucleares iranianas — anunciados no último sábado (21) pelo presidente Donald Trump —, qualquer gesto simbólico do Brasil pode ser interpretado como posicionamento geopolítico.
Conflito eleva riscos para o Brasil
O impacto do confronto sobre o mercado internacional de petróleo preocupa. O Irã responde por cerca de 20% do comércio global da commodity, e a instabilidade no estreito de Ormuz — cuja interdição foi aprovada pelo Parlamento iraniano — pode travar o trânsito de navios petroleiros na região.
O reflexo direto é a alta no preço do barril, com consequências imediatas sobre combustíveis, alimentos e transporte, afetando a inflação brasileira. Em um momento em que o Banco Central já sinaliza dificuldades para controlar os preços e manter a trajetória de corte de juros, o cenário externo adiciona uma nova camada de incerteza.
“A inflação brasileira é muito sensível ao preço do petróleo. Uma alta duradoura no barril pode comprometer o consumo e desorganizar a cadeia de suprimentos, sobretudo de alimentos e energia”, explica um analista econômico do setor bancário.
Risco de retaliações comerciais
Além da pressão inflacionária, o Brasil pode enfrentar sanções ou retaliações comerciais, caso haja percepção de alinhamento ao Irã — país historicamente em conflito com aliados estratégicos do Brasil, como Estados Unidos, União Europeia e Israel. A preocupação do mercado é que uma eventual declaração imprudente do presidente Lula afaste investidores e parceiros comerciais em um momento de fragilidade econômica.
“Não se trata apenas de diplomacia. Trata-se de negócios. Um deslize verbal pode gerar perda de contratos, suspensão de acordos e fuga de capitais”, pontua um executivo de banco internacional.
China e Rússia, aliados do Irã, têm se posicionado de forma cautelosa até agora, evitando envolvimento militar direto. Mas eventuais sanções econômicas ou mudanças nas cadeias comerciais globais podem afetar países do sul global, como o Brasil, que depende do equilíbrio geopolítico para manter o comércio exterior em operação estável.
Lula e a política externa
Desde o início de seu terceiro mandato, Lula tem adotado uma política externa mais ativa, com foco em recuperar o protagonismo do Brasil em fóruns multilaterais. No entanto, essa estratégia tem sido criticada por setores do mercado que consideram algumas declarações do presidente como “ideológicas demais” e desalinhadas com os interesses econômicos do país.
No caso do conflito Israel-Irã, a expectativa do setor financeiro é de que o Planalto adote uma postura de neutralidade institucional. Para os investidores, qualquer ruído nesse sentido pode ser interpretado negativamente.
“Queremos um Brasil que preserve sua diplomacia, mas que pense como um país integrado ao sistema econômico global. É hora de pragmatismo”, resume um gestor de fundo de investimentos.
Pragmatismo é a palavra de ordem
O cenário exige moderação — tanto nas palavras quanto nas ações. Economistas e agentes de mercado recomendam que o governo se concentre nas questões internas e mantenha foco na agenda de reformas, no controle da inflação e na recuperação do crescimento. Intervenções em temas de geopolítica, principalmente em um momento de alta tensão militar, podem causar mais danos do que ganhos.
Como sintetizou um banqueiro de investimentos, “é só o presidente não falar nada”. O silêncio, nesse caso, pode ser o melhor discurso.