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Entre nostalgia e sobrevivência emocional, por que bichos de pelúcia voltaram à vida adulta

Basta observar com atenção alguns quartos de jovens adultos para perceber um detalhe que, à primeira vista, parece fora de lugar. Entre móveis modernos, objetos de design e referências pop, lá está um ursinho de pelúcia. O que antes era associado exclusivamente à infância passou a ocupar espaço na vida de pessoas na casa dos vinte e poucos anos, sem constrangimento e, muitas vezes, com orgulho.

Nos últimos meses, redes sociais como TikTok e Instagram foram tomadas por imagens de adultos exibindo pelúcias, bonecos colecionáveis e personagens “fofos”. Longe de ser apenas uma tendência passageira, o movimento revela mudanças mais profundas no comportamento e no consumo dessa geração. Dados recentes da consultoria Circana mostram que 43% dos adultos no Reino Unido compraram brinquedos para si mesmos ou para outros adultos neste ano. Entre pessoas de 18 a 34 anos, esse índice sobe para 76%, indicando que adultos passaram a sustentar uma fatia relevante da indústria de brinquedos.

Esse fenômeno caminha lado a lado com a nostalgia. Pesquisas do GWI apontam que uma parcela significativa dos jovens prefere olhar para o passado em vez de projetar o futuro, demonstrando apego emocional a referências culturais anteriores à própria infância. O crescimento das vendas de discos de vinil e o resgate de tecnologias consideradas ultrapassadas seguem a mesma lógica: mais do que consumo, trata-se de criar uma âncora emocional em um cotidiano marcado por excesso de estímulos e incertezas.

Nesse contexto, o analógico assume um novo papel. Objetos táteis e afetivos funcionam como uma forma de desacelerar, criar pertencimento e recuperar algum senso de controle. Em contraste com uma vida hiperconectada e performática, o simples ato de abraçar uma pelúcia pode representar conforto e segurança.

Há também um componente de humor nessa equação. A chamada “geração não séria” utiliza a leveza como mecanismo de sobrevivência. Rir, brincar e ironizar o próprio caos virou estratégia para lidar com crises econômicas, instabilidade profissional e insegurança emocional. A ciência ajuda a explicar parte desse comportamento ao indicar que o cérebro humano segue em desenvolvimento emocional até o início da terceira década de vida, justamente quando o mundo exige decisões cada vez mais complexas.

Entre relações afetivas frágeis, medo de compromissos e um futuro financeiro incerto, o retorno a símbolos da infância não significa necessariamente regressão. Pode ser, na prática, uma forma de adaptação. O ursinho de pelúcia no quarto adulto não é o problema, mas um sinal de como essa geração tenta encontrar equilíbrio em tempos difíceis.

GED

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