Entre a bola e a fronteira: Copa nos EUA desafia clima anti-imigrante

Com festa nas arquibancadas e repressão nos bastidores, torneio reflete o choque entre a paixão pelo futebol e as políticas migratórias da era Trump
A Copa do Mundo de Clubes, disputada neste mês nos Estados Unidos, tem sido marcada não apenas pela disputa esportiva, mas também por um pano de fundo político sensível: a tensão migratória envolvendo a comunidade latina e o endurecimento das políticas de segurança sob a nova administração do republicano Donald Trump. Com a presença de 32 clubes — incluindo oito da América Latina — o torneio tornou-se vitrine de contrastes entre celebração e vigilância.
Em Miami e Los Angeles, cidades que concentram grandes populações de origem latina, a organização do evento surpreendeu ao confirmar a presença de agentes do ICE (Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA) nas áreas de segurança dos estádios. A decisão gerou desconforto em meio à expectativa de que o torneio seria uma celebração da diversidade cultural e da paixão pelo futebol, especialmente entre imigrantes.
Estima-se que mais de 60 milhões de latinos vivam atualmente nos Estados Unidos — a maioria de origem mexicana, mas com cerca de 1,9 milhão de brasileiros incluídos nesse contingente. Para muitos, o futebol é mais do que esporte: é identidade, memória e ponto de encontro. Por isso, o Mundial tornou-se, na prática, um símbolo de resistência pacífica.
Festa nas ruas e arquibancadas
Apesar do clima político tenso, as primeiras semanas da competição foram marcadas por festas espontâneas dos torcedores sul-americanos. O Brasil teve presença destacada: flamenguistas posaram diante da icônica estátua de Rocky Balboa, na Filadélfia; torcedores do Fluminense tomaram as ruas de Nova York; e botafoguenses marcaram presença em Seattle.
Mas a imagem que mais viralizou nas redes sociais foi a multidão de palmeirenses que ocupou a Times Square, em Manhattan, com bandeiras, cantos e tambores. A cena impressionou até o presidente da Fifa, Gianni Infantino.
“Foi incrível encontrar milhares de torcedores apaixonados”, afirmou o dirigente em entrevista coletiva.
Portões fechados para alguns
Nem todos, porém, conseguiram participar da festa. Diversos torcedores brasileiros tiveram vistos negados pelas autoridades americanas, mesmo com ingressos em mãos e pacotes de viagem pagos. A justificativa oficial segue critérios de segurança, mas críticos veem na ação um reflexo direto da política anti-imigração promovida por Trump, especialmente contra países latino-americanos.
Até o momento, não há registro de ações repressivas nos estádios ou arredores, mas a simples presença de agentes do ICE tem sido vista como intimidação simbólica.
Futebol como reflexo social
O caso da Copa do Mundo de Clubes nos EUA deixa claro que o futebol, mesmo quando planejado como espetáculo global, não escapa das tensões geopolíticas. A escolha do país-sede em pleno endurecimento das políticas migratórias foi recebida com desconfiança por parte das torcidas organizadas da América do Sul.
Especialistas em relações internacionais apontam que o evento pode acabar sendo lembrado tanto pelas grandes jogadas em campo quanto pelo contexto político que envolveu os bastidores.
Mais do que um torneio, o Mundial de Clubes de 2025 está se tornando um retrato do momento histórico em que o futebol encontrou um muro — e respondeu com festa.