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Biden lava as mãos sobre tomada do poder pelo Taleban em 1º pronunciamento

Um dia após o Taleban tomar o controle do Afeganistão, o presidente Joe Biden veio a público reafirmar sua decisão de retirar as tropas americanas do país e atribuiu a culpa do colapso do país no governo e nos militares afegãos.

“Os líderes do país fugiram. Isso comprovou que não devemos estar lá. Não devemos lutar e morrer em uma guerra que os afegãos não querem lutar. Demos a eles todas as chances que podíamos, mas não podíamos dar a vontade de lutar”, declarou Biden, em discurso na Casa Branca, nesta segunda (16).

“Conversei com Ashraf Ghani [ex-presidente afegão]. Tivemos conversas francas. Avisei que o Afeganistão deveria estar pronto para lutar uma guerra civil, combater a corrupção e fazer negociações internas. Eles falharam em cumprir tudo isso”, prosseguiu o democrata. Ghani deixou o poder no fim de semana e se refugiou no exterior. Ele disse que fez isso para evitar um banho de sangue no país.

Biden disse que, na situação atual, não haveria como manter a paz no país sem enviar mais soldados, o que levaria a uma terceira década de conflitos. “Quantas gerações mais teríamos de enviar para lá? Não vou repetir erros do passado, de lutar em guerras sem fim que não tem a ver com os interesses dos EUA. Mantenho minha decisão. Não haveria uma hora certa para retirar as tropas do Afeganistão.”

O presidente repetiu que a missão dos EUA no país era capturar os terroristas por trás dos ataques de 11 de setembro de 2001 e evitar que grupos radicais usassem o Afeganistão como base, e que isso foi cumprido. Ele lamentou a situação atual, mas disse que a missão americana nunca teve como meta construir um país.

O democrata disse ainda que a missão agora é tirar os cidadãos americanos e aliados do Afeganistão, e que caso o Taleban tente atrapalhar isso, sofrerá represálias. Também lamentou as cenas vistas no país nos últimos dias e prometeu ajudar afegãos que ajudaram os EUA durante a ocupação militar a deixarem o país. “Muitos deles não saíram antes porque acreditavam que o país poderia se estabilizar”, disse.

Nesta segunda, uma multidão de afegãos tentaram embarcar em aviões que deixavam o aeroporto de Cabul. Vídeos mostram pessoas tentando subir em aeronaves em movimento, prestes a decolar, para tentar deixar o país. Muitos no país temem que o novo governo Taleban retome políticas fundamentalistas, como a proibição de que mulheres possam estudar e trabalhar fora de casa.

Em uma tentativa de passar uma imagem de moderação, Suhail Shaheen, porta-voz do Taleban, escreveu em uma rede social que o grupo tem ordem para não atacar a população. “A vida, a propriedade e a honra não podem ser feridas e deverão ser protegidas pelos mujahedins [guerrilheiros islâmicos]”, afirmou.

Também nesta segunda, o secretário de Estado, Antony Blinken, conversou com os ministros de Relações Exteriores da China e da Rússia sobre a situação no Afeganistão. Os dois países sinalizaram que planejam ter relações diplomáticas com um governo afegão comandado pelo Taleban.

Biden estava em silêncio desde sábado (14), quando reafirmou sua decisão pela retirada, em um comunicado. No domingo (15), a Casa Branca divulgou uma imagem dele em uma reunião virtual em Camp David, casa de campo presidencial, para tratar da questão.

O democrata deveria tirar alguns dias de férias, mas retornou nesta segunda, depois que as cenas de caos no Afeganistão em meio à tomada de poder pelo Taleban geraram críticas ao governo americano, pela falta de planejamento na retirada.

No domingo (15), Biden foi atacado por republicanos e ex-dirigentes militares durante a gestão de Barack Obama. Ryan Crocker, ex-embaixador no Afeganistão, disse que a saída demonstrou uma “total falta de coordenação e planejamento pós-retirada”. David Petraeus, ex-diretor da CIA, classificou a situação de catastrófica e um enorme revés para a segurança nacional.

“Se você tivesse mantido o status quo, com 2.500 ou 3.500 militares em solo conduzindo operações contra o terrorismo, esta catástrofe não teria que acontecer”, disse Liz Cheney, deputada republicana de Wyoming, à TV ABC.

No fim de semana, a imprensa americana destacou declarações de Biden, de semanas atrás, que mostravam contradições. Em julho, ele havia prometido que os EUA continuariam dando apoio ao governo afegão e disse acreditar que o Taleban não tomaria o poder à força, como ocorreu no domingo, pois os militares afegãos estariam bem treinados e equipados.

Pesquisas mostram que a maioria dos americanos, dos dois partidos, apoiam a saída dos EUA do país. No entanto, o presidente vem sendo criticado pela forma caótica como a saída vem ocorrendo, como as informações de inteligência do governo estavam erradas e por que seu governo prometia um cenário totalmente diferente do que ocorreu.

Estimava-se que as forças afegãs conseguiriam conter o avanço deles, ou ao menos resistir por alguns meses. Mas o governo local colapsou em semanas, a embaixada dos EUA em Cabul foi fechada às pressas e as cenas de afegãos tentando embarcar de qualquer jeito em aviões para deixar o país -inclusive tentando se agarrar à aeronaves em movimento- reforçam a imagem de que houve uma derrota americana.

Esta guerra, que começou em setembro de 2001, é a mais longa já disputada pelos EUA. Biden questionava há anos a presença americana no país. “Eu me oponho a ter forças permanentes no Afeganistão. Nenhuma nação jamais unificou o Afeganistão. Impérios foram lá e não fizeram isso”, disse no mês passado.

A saída militar havia sido acordada pelo governo anterior, de Donald Trump. Em setembro de 2020, o republicano iniciou uma negociação com o Taleban, apontando para a retirada das tropas americanas do Afeganistão em 2021. Biden deu sequência às tratativas e, em 14 de abril, anunciou que colocaria fim à operação no Afeganistão até a simbólica data de 11 de setembro de 2021. Em seguida, antecipou o prazo para 31 de agosto, o que encorajou o Taleban a avançar rapidamente.

GED

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