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Padres racham entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad

Missas e redes sociais vêm servindo de termômetro para o cisma político dentro da Igreja Católica

Jair Bolsonaro (PSL)ou Fernando Haddad (PT)? Não são só mesas de bares e grupos de WhatsApp que têm se dividido sobre a eleição mais polarizada do Brasil nas últimas décadas.

Missas e redes sociais vêm servindo de termômetro para o cisma político dentro da Igreja Católica, com padres e até bispos tomando partido, apesar de o direito canônico desestimular posicionamentos de natureza política.

Nesta quarta-feira (17), dom Orani Tempesta, bispo da Arquidiocese do Rio, se encontrará com Bolsonaro, dois dias após seu bispo auxiliar, dom Antônio Augusto Dias Duarte, passar uma hora na casa do candidato do PSL –que tratou de publicar a foto com o religioso em seu Twitter.

Duas figuras populares do clero local já fizeram acenos ao capitão reformado: Jorjão e Omar Raposo (reitor do santuário sob os pés do Cristo Redentor), tidos como padres popstar e amigos de celebridades como Zeca Pagodinho e Elba Ramalho, visitaram o presidenciável esfaqueado no hospital. A foto viralizou entre bolsonaristas.

A assessoria do padre Omar disse que a reunião só aconteceu pois “ele estava no hospital visitando outra pessoa e, como sempre acontece com os sacerdotes, foi chamado a abençoar outros enfermos. Entre eles, o Bolsonaro”.

Monsenhor Sérgio Tani preside o tribunal eclesiástico da Arquidiocese de São Paulo, que julga de processos internos da Igreja a pedidos para declarar nulo um matrimônio.

No tribunal na internet o veredito do monsenhor é claro: reproduz diariamente textos contra o PT. “Bolsonaro começou com a tortura, fez o Haddad e a Manu assistirem [sic] missa”, afirma um deles, acompanhado do emote de uma carinha chorando de tanto rir.

O petista e sua vice, Manuela D’Ávila (PC do B), participaram de uma missa na Paróquia dos Santos Mártires, na periferia paulistana na sexta (12), feriado de Nossa Senhora Aparecida, e lá comungaram (receberam a hóstia).

Jaime Crowe, padre que celebrou o ato litúrgico, perguntou aos fiéis “como chegamos” ao ponto em que “alguém pode dizer para nós bandido bom é bandido morto, que tem que armar todo mundo”.

De Campinas, o padre Rodrigo Catini Flaibam foi no mesmo dia ao Facebook criticar a dupla. “Comungar quando não se é católico (Manuela declara-se não cristã e defende abertamente aborto) é sacrilégio. Comungou a própria condenação. E o padre que permitiu tal disparate está em pecado grave”, escreveu.

Em entrevista à Folha de S.Paulo no ano passado, Manuela declarou que sua “origem é cristã”. À reportagem ela disse nesta terça-feira (16) que “todos estão pautados pelas fake news, que mundo maluco”.

Já Haddad é cristão ortodoxo, e não católico apostólico romano –alas do catolicismo com divergências teológicas.

Mas não pecou, segundo o Código de Direito Canônico: “Os ministros católicos administram os sacramentos da Penitência [confissão], Eucaristia e Unção dos Enfermos licitamente aos membros das Igrejas Orientais que não têm plena comunhão com a Igreja Católica se esses os buscarem por sua própria vontade”.

Padre Rodrigo chama Haddad de Calamiddade e, quando o petista abriu mão da cor do PT em sua propaganda, provocou:””Está vermelho de vergonha?”. Incluiu nome e número de Bolsonaro em sua foto no perfil do Facebook, como tantos colegas da Igreja.

A defesa de Bolsonaro anda de mãos dadas com o antipetismo e nem sempre se limita à internet. “Como você cala a boca das pessoas? Ou você dá uma facada…” Padre Paulo Ricardo mal termina a frase, clara alusão ao atentado contra o candidato, e o público que acompanha sua fala aplaude e bradar: “Mito! Mito! Mito!”.

As palmas diminuem, e ele continua: “…ou você realiza aquilo que Bento 16 chama de martírio dos tempos modernos, que é caluniar, desacreditar e inventar mentiras sobre essas pessoas”.

Querido por movimentos de direita e apelidado de “Malafaia da Igreja Católica” por blogs de esquerda, o clérigo ganhou projeção em 2014, com bofetadas contínuas no PT de Dilma Rousseff –como o texto em que diz que “o governo Dilma prepara-se para implantar aborto no Brasil”.

Após o vídeo viralizar, Paulo Ricardo divulgou uma “nota de esclarecimento” afirmando que apenas se valeu de um “recurso retórico, uma alusão ao atentado sofrido por Bolsonaro”. A fala teria sido descontextualizada. “As pessoas que estão usando minha imagem para fins eleitorais fazem-no sem a minha permissão.”

Esses são alguns dos antipetistas declarados. Mas o repúdio ao candidato do PSL também ecoa entre o clero brasileiro. No texto “Votar com Lucidez”, reproduzido no site da regional sul da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom Reginaldo Andrietta, da Diocese de Jales (SP), não cita o nome de Bolsonaro.

E nem precisaria, não no entendimento de eleitores do militar reformado que defenestraram o bispo que escreveu contra as “escandalosas posturas alienadas de muitos cristãos e as adesões a um candidato à Presidência que dissemina violência, ódio, racismo, homofobia e preconceito contra mulheres e pobres”.

“Ele utiliza falsamente as temáticas de aborto, gênero, família e ética; faz apologia à tortura, à pena de morte e ao armamentismo; e é réu por injúria e incitação ao crime de estupro”, diz dom Reginaldo.

Em maio, o reitor do Santuário Nacional Aparecida, padre João Batista de Almeida, pediu desculpas após celebrar uma missa pela libertação do ex-presidente Lula, preso 40 dias antes, e ser chamado de comunista nas redes sociais.

Aconteceu na celebração da Eucaristia, quando ele rogou a “Nossa Senhora Aparecida” para abençoar o petista e lhe dar “muitas forças para que se faça a verdadeira justiça, para que o quanto antes ele possa estar entre nós, construindo com o nosso povo um projeto de país que semeie a justiça e a fraternidade”. Na plateia, manifestantes com camisas vermelhas da CUT e enrolados em bandeiras do PT.

A oratória enxameou as redes sociais com críticas a João Batista, como o tuiteiro que sugeriu “a excomunhão do padre”, que seria “o melhor que a Igreja pode fazer para se livrar dessa mácula comunista”.

Igreja não é lugar de tomar “posição político-partidária, que é contrária ao Evangelho”, afirma a nota em que pede “perdão pela dor que geramos à Mãe Igreja, aos fiéis e às pessoas de boa vontade”.

A cúpula da CNBB também entrou na mira de propagadores do bolsonarismo, após seu presidente, o cardeal Sérgio da Rocha, dizer em fevereiro que a entidade rejeitará “candidatos que promovam ainda mais a violência”, fala que foi interpretada como uma indireta ao presidenciável do PSL.

Fake news que mexem com a fé proliferam num país onde 86% brasileiros se declaram cristãos, com 54% de católicos e 32% de evangélicos, segundo pesquisa Datafolha.

Uma das mais recentes simula uma notícia da Folha de S.Paulo que nunca existiu: uma proposta de Bolsonaro para embranquecer a imagem de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil, que é negra na representação tradicional.

Segundo o texto falso, a ideia teria sido discutida em reunião com o bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal, que apoia sua candidatura.

Para Rodrigo Coppe Caldeira , historiador que pesquisa religião na PUC de Minas, “podemos dizer que há uma mobilização evidente das igrejas, principalmente por esta eleição ter um cheiro -ou mau cheiro- de guerra cultural”. Com informações da Folhapress.

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