Lideranças da Câmara veem pressão por anistia como “tiro no pé” e rejeitam avanço do projeto

Mesmo com a pressão exercida durante o ato liderado por Jair Bolsonaro (PL) na Avenida Paulista neste domingo (6), líderes da Câmara dos Deputados disseram, reservadamente, que não veem clima político para o avanço do projeto de lei que propõe anistia aos presos pelos atos golpistas de 8 de janeiro. A investida pública contra o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), foi interpretada por integrantes de diversos partidos como um movimento arriscado e potencialmente prejudicial ao PL.
Para o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), a estratégia bolsonarista de confronto direto com o presidente da Câmara pode ter efeito contrário. “É uma tática de desespero. Se acham que Hugo vai pautar alguma coisa essa semana depois de tentarem emparedar ele, estão errados”, afirmou.
O líder do PDT, Mário Heringer (MG), também criticou a abordagem. “Atacar Hugo Motta é um desserviço institucional, mantém a atitude transgressora contra as instituições e Constituição. O movimento do encontro é legítimo, mas mais uma vez errático”, disse.
Durante o ato, o pastor Silas Malafaia foi o principal porta-voz dos ataques a Motta. Em cima do carro de som, o religioso questionou a postura do presidente da Câmara por, supostamente, pedir que líderes partidários não assinassem o requerimento de urgência do projeto. “Sr. presidente da Câmara, Hugo Motta, disse ‘eu sou árbitro, juiz’. Só se for juiz iníquo, porque ele pediu para os líderes partidários para não assinar urgência do projeto de anistia”, afirmou.
Malafaia ainda pressionou publicamente o deputado: “Espero, Bolsonaro, se Hugo Motta estiver assistindo isso aqui, que ele mude, porque você, Hugo Motta, está envergonhando o honrado povo da Paraíba.”
O líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), afirmou durante o ato que o partido já teria conseguido 165 assinaturas, de um total de 257 necessárias, e prometeu intensificar a pressão publicando os nomes e fotos dos parlamentares indecisos a partir desta segunda-feira (7). “Até quarta [9], presidente Bolsonaro, vamos ter, com ajuda do Caiado, Zema, Tarcísio, Wilson Lima, sim, as 257 assinaturas”, garantiu.
Apesar disso, líderes partidários aliados a Motta negam que ele tenha pedido diretamente para que não assinassem o requerimento. Ainda assim, compartilham do entendimento de que não é o momento adequado para discutir a proposta. Alegam a necessidade de manter a harmonia entre os poderes e citam também a falta de apoio no Senado, onde o presidente Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) já declarou não considerar o tema prioritário.
Mesmo os partidos de governadores que subiram ao palanque com Bolsonaro — como Republicanos, União Brasil, PP e PSD — não autorizaram a assinatura do requerimento, numa tentativa de evitar confronto direto com a liderança da Câmara.
O ato reuniu 55 mil pessoas, segundo o Datafolha, e contou com a presença de sete governadores: Tarcísio de Freitas (SP), Ronaldo Caiado (GO), Romeu Zema (MG), Jorginho Mello (SC), Wilson Lima (AM), Ratinho Jr. (PR) e Mauro Mendes (MT). O vice-presidente da Câmara, Altineu Côrtes (PL-RJ), reforçou a tese de que a maioria da Casa poderá impor a pauta. “Motta será pautado pela maioria da Câmara dos Deputados”, declarou.
No governo, os ataques ao presidente da Câmara e ao STF foram vistos como mais uma demonstração do caráter antidemocrático do movimento. A ministra Gleisi Hoffmann (PT), responsável pela articulação política do Planalto, disse que a palavra “anistia”, usada no ato, não passa de uma farsa. “Querem apagar os fatos que aterrorizaram o país, mas não são capazes de esconder a violência e o ódio que continuam guiando suas ações”, afirmou.
O ministro da AGU, Jorge Messias, classificou o evento como um fracasso da extrema direita. Já Paulo Teixeira (PT), do Desenvolvimento Agrário, ironizou a tentativa de Bolsonaro de discursar em inglês, chamando o ato de “espetáculo de irrelevância e constrangimento em dois idiomas”.