Condenados por racismo não poderão mais atuar como advogados no Brasil

Da Redação
[email protected]
O crescimento dessa ameaça, a pressão por soluções legislativas e técnicas tende a aumentar nos próximos meses.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou, neste mês de junho, uma nova súmula que proíbe a inscrição de bacharéis em direito condenados por racismo. A medida, acolhida por aclamação durante sessão do conselho, estabelece que a prática desse crime é incompatível com a idoneidade moral exigida para o exercício da advocacia.
A relatoria do processo ficou a cargo da conselheira federal Shynaide Mafra Holanda Maia (PE), que defendeu a exclusão dos condenados por racismo com base na gravidade do ato e em conformidade com o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ambas as cortes já consolidaram jurisprudência reconhecendo o racismo como crime inafiançável e imprescritível.
“A prática do racismo revela a ausência de idoneidade moral, um princípio essencial para o exercício da advocacia”, afirmou a conselheira Shynaide durante a sessão.
Iniciativa teve origem no Piauí
A proposição partiu da seccional da OAB no Piauí, por meio do presidente Raimundo Júnior, do conselheiro federal Ian Cavalcante e da secretária-geral da seccional, Noélia Sampaio. A proposta recebeu apoio unânime do plenário e foi considerada um avanço institucional no combate à discriminação racial dentro da advocacia brasileira.
A decisão amplia o escopo das súmulas já editadas pela OAB em 2019, que vetam a inscrição de condenados por violência contra a mulher, crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência e a comunidade LGBTQIA+.
Durante a votação, a entidade prestou homenagem a Esperança Garcia — mulher negra escravizada que, em 1770, redigiu uma petição denunciando abusos e é reconhecida como a primeira advogada do Brasil — e também a lideranças negras da advocacia contemporânea.
Sem OAB, sem direito de advogar
Para exercer legalmente a advocacia no Brasil, é obrigatório ter diploma de bacharel em direito e aprovação no Exame de Ordem da OAB, além de passar pela análise de idoneidade moral. A nova súmula impacta diretamente esse terceiro requisito, impedindo que pessoas condenadas por racismo obtenham o registro profissional.
“A OAB não pode admitir em seus quadros profissionais que atentem contra a dignidade humana e os princípios constitucionais da igualdade e do respeito às diferenças”, reforçou o conselheiro Ian Cavalcante. A decisão também se baseia em normas do Código de Ética e Disciplina da OAB, que exigem conduta irrepreensível de seus membros e preveem sanções para práticas discriminatórias.
Condenação definitiva é critério objetivo
A súmula aprovada considera como critério para a exclusão da possibilidade de inscrição a existência de condenação com trânsito em julgado — ou seja, quando não cabe mais recurso. Ainda assim, a entidade deixou claro que cada caso será analisado individualmente, a fim de garantir o devido processo legal e o contraditório. Especialistas em direito consideram a medida positiva e alinhada com a crescente pressão por equidade racial nas instituições jurídicas brasileiras. Organizações do movimento negro também celebraram a decisão como uma vitória histórica.
Sem o registro na OAB, qualquer tentativa de atuação na advocacia por parte de bacharéis condenados por racismo será considerada exercício ilegal da profissão — prática que configura contravenção penal, punível com multa ou até prisão.