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Câmara de Iporá arquiva ação de impeachment de prefeito preso por tentar matar ex-mulher

A Câmara de Iporá (GO) arquivou o processo de impeachment do prefeito Naçoitan Araújo Leite (sem partido), que reassumiu o cargo em 19 de fevereiro, três meses após ser preso e indiciado por tentar matar a ex-mulher e o namorado dela

A presidente da Comissão Especial Processante, montada para analisar o pedido de impeachment, vereadora Heb Keller (Republicanos), alegou que o arquivamento aconteceu por causa do prazo.

“O processo deveria estar concluído dentro de 90 dias, contados da data em que se efetivar a notificação do acusado. Transcorrido o prazo sem julgamento, o processo será arquivado, sem prejuízo de nova denúncia ainda que sobre os mesmos prazos”, destaca um trecho da decisão.

Keller afirmou, em entrevistas, que, logo após o arquivamento, dois vereadores disseram que vão apresentar novos pedidos de impeachment, além dela.

Prefeito agradeceu “o povo” e “as igrejas”

Naçoitan deixou a cadeia em 16 de fevereiro, quando o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) concedeu liberdade provisória mediante medidas cautelares, que incluem uso de tornozeleira eletrônica e distanciamento das vítimas.

Ao sair do presídio, onde estava desde 23 de novembro, Naçoitan foi festejado por um grupo de apoiadores. Já os vereadores da cidade se apressaram para dar posse a ele novamente, em solenidade realizada no fim da tarde de 17 de fevereiro. Dois dias depois, uma segunda-feira, Naçoitan publicou um vídeo em suas redes sociais, anunciando a sua volta ao posto de prefeito de Iporá.

Ele também agradeceu “o povo” e “as igrejas” que rezaram por ele no período em que esteve preso. E nada falou sobre o motivo da sua prisão. “Hoje o nosso nome é humildade e trabalho”, afirmou o prefeito.  

Até então, Iporá vinha sendo administrada pela vice-prefeita, Maysa Cunha (PP), que rompeu politicamente com Naçoitan. Ela só assumiu o cargo porque o Ministério Público de Goiás interveio. Havia grande resistência da Câmara municipal, onde Naçoitan tem maioria, mesmo após o crime – conta com o apoio de 10 dos 13 vereadores.

Prefeito invadiu a casa da ex com uma caminhonete e desceu atirando

Naçoitan Leite invadiu a casa da ex-companheira com uma caminhonete e deu ao menos 15 tiros contra ela e o namorado, na madrugada de 18 de novembro. Vídeo de câmera de segurança mostra o prefeito descendo da caminhonete, olhando pelas frestas do portão da frente da casa da ex, voltando ao veículo,  manobrando, colocando-o de frente para o imóvel e acelerando. A picape derrubou o portão e foi parar na sala, após quebrar portas e móveis. Em seguida, o prefeito começou a atirar contra o quarto do casal, que sobreviveu ao atentado.

A mulher e o namorado dela ficaram dentro do quarto e não se feriram. Naçoitan fugiu após a invasão. O delegado da cidade pediu a prisão preventiva de Naçoitan e a Justiça expediu o mandado no dia seguinte à invasão. Em depoimento, a mulher contou que o prefeito não aceitava o fim do relacionamento, que durou 15 anos e terminou há cerca de dois meses. Desde então, ele a vinha ameaçando. Vídeos dele rondando a casa dela foram entregues à polícia.

Prefeito foi indiciado por quatro crimes

Naçoitan Leite se entregou à polícia cinco dias após o crime. Em depoimento, ele alegou que não se lembrava de nada. Foi indiciado pela Polícia Civil de Goiás por tentativa de feminicídio, tentativa de homicídio, fraude processual majorada e posse de arma de fogo de uso restrito com numeração raspada. 

O prefeito de Iporá usou duas armas diferentes na tentativa de matar a ex-companheira e o namorado dela. E funcionários do político são suspeitos de terem furtado equipamento de gravação das câmeras de vigilância do local do crime. Imagens de casas vizinhas mostram um grupo indo ao local após a fuga do atirador e subtraindo o aparelho. 

“Imagens de câmeras de segurança mostram que um veículo modelo Gol, de cor branca, para em frente à residência da vítima e logo após sai do local e nós percebemos a subtração desse aparelho de DVR. Durante as buscas de apreensão, encontramos possivelmente esse mesmo veículo na fazenda do prefeito”, contou o delegado Ramon Queiroz, da Polícia Civil de Goiás, em entrevista coletiva.

“A perícia nos informou que foram encontrados projéteis de diferentes calibres na residência, então possivelmente o prefeito teria utilizado duas armas”, completou Ramon Queiroz. Mandados de busca e apreensão foram cumpridos por policiais civis na casa e na fazenda de Naçoitan Leite. Além do Gol, que está no nome de um funcionário da fazenda do prefeito, foram apreendidas munições. A caminhonete usada na tentativa do duplo assassinato não foi encontrada. 

Prefeito tem histórico de ameaças e abuso de poder

Distante 216km de Goiânia, Iporá fica no Oeste de Goiás e tem 35 mil habitantes. O plantio de grãos, em especial a soja, é o motor da economia local. Produtor rural, Naçoitan Leite, de 60 anos, tem histórico de abusos de poder e de violência, além de problemas com a Justiça Eleitoral. Em seu segundo mandato consecutivo, está prestes a perder o mandato.

O Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE-GO) cassou os registros de candidatura de Naçoitan Leite e de seu vice, Duílio Alves de Siqueira, em 2016. Conforme denúncia do Ministério Público, aceita pelos integrantes da Corte, a dupla se beneficiou de condutas irregulares do ex-prefeito Danilo Gleic dos Santos, que apoiava a chapa.

Os advogados da dupla recorreram, mas, em 2020, o TRE-GO manteve a sentença de cassação. O afastamento do prefeito e do vice-prefeito aconteceria após o julgamento dos embargos declaratórios.

Já como prefeito de Iporá, Naçoitan foi gravado tentando convencer fiscais de trânsito a não montar blitz com bafômetro em uma rua da cidade, em 2018. A gravação mostrou uma discussão entre o prefeito e um agente, em que o político tentava convencê-lo a não montar bloqueio no dia em que ocorria a exposição agropecuária da cidade.

Em 2021, o vereador Moisés Victor Magalhães denunciou que teria sido agredido pelo prefeito ao filmá-lo num churrasco. Nas redes sociais, o parlamentar divulgou fotos de ferimentos nos braços, nas costas e na cabeça. O caso foi parar na polícia.

Na época, o prefeito alegou que o vereador foi indagado sobre o motivo da filmagem pelos presentes e, como reação, teria atirado uma pedra no grupo. Naçoitan negou qualquer agressão e disse que se escondeu para fugir da confusão.

Prefeito defendeu ‘eliminar’ Lula e Moraes

Recentemente, em 2022, Naçoitan, que apoiou a reeleição de Jair Bolsonaro (PL),  ameaçou “eliminar” o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

“Até a nossa liberdade está em jogo também. Nós temos que eliminar o Alexandre de Moraes e o Lula. Dois homens estão acabando com o Brasil. Vai virar uma guerra civil por causa de dois homens. Então, vamos arregaçar as mangas. Ou é agora, ou vamos virar a Venezuela. Ou pior que a Venezuela, porque o presidente da Argentina já está morando no Brasil”, afirmou Naçoitan no vídeo.

Já em março de 2022, também por meio de vídeo distribuído pelo Whatsapp em grupos do nos grupos do Sindicato Rural de Iporá, do qual ele é um dos líderes, incitou violência contra supostos petistas da cidade. “PT com nós (sic) aqui agora é na botina, e se for preciso na bala, entendeu?”, disse o prefeito.

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